quinta-feira, 8 de abril de 2021

A volta na planície em 98 dias.

Com as devidas licenças e escusas a Julio Verne, o célebre autor de "A Volta Ao Mundo Em 80 Dias", tomei emprestado parte do título para dar uma dimensão aos poucos leitores e leitoras deste texto dos percursos e caminhos simbólicos e reais percorridos pelo atual Prefeito da cidade de Campos do Goytacazes.

Muita gente vai esperar os 100 dias.

Como não tenho muito talento para a coisa, decidi chamar à atenção escrevendo antes, ou, "onça que acorda cedo, bebe água mais limpa".

Pois bem, introduções feitas, vamos à vaca fria.

É preciso dividir a análise em duas, para depois, ao fim reunir novamente.

Desnecessário falar sobre a Dinastia Garotinho no cenário histórico recente da política regional e local, e quiçá nacional, para o bem ou para o mal.

No entanto, nenhuma consideração ou teoria séria sobre o desempenho do herdeiro deste legado político poderá se afastar muito da influência que seus pais têm sobre ele.

Tenho observado com especial atenção ao jeito do atual Prefeito, e sua aparente tentativa de estabelecer uma divisa drástica com a fracassada administração anterior, ao mesmo tempo que busca fazer a todos crerem que não é uma repetição dos seus pais, ou melhor dizendo, não é a volta da roda da História.

Por óbvio que isso seria impossível, mas o fato é que o atual Prefeito tem procurado estabelecer pontes ou recuperar aquelas rompidas pelo desgaste natural do projeto político de seus pais, e nisso também eu contrabandeio uma psicologia de botequim ao dizer que me parece que o atual Prefeito buscar romper com esta identificação política com seus pais, porém ao mesmo tempo, e paradoxalmente, precisa dela, pelo menos enquanto não tiver a sua imagem própria.

Aí que mora o perigo desta jornada de quase 100 dias, esta volta ao "pequeno mundo de Bob", a planície.

O atual Prefeito é parte de sua geração, conectada, individualista, com pouca leitura, ou com leitura de pouca densidade, salvo raras e honrosas exceções.
Esta geração se comunica por um dialeto entrecortado de imagens ("emojis") e contrações gramaticais ("vc", "kd"), afeita à superexposição, de respostas e atos instantâneos e, algumas vezes, irrefletidos, superexcitados e com tendências ao desânimo profundo.

Este corte geracional é fruto do derretimento das esferas públicas de sociabilidade, do fim do capitalismo como sistema de organização econômica, e ao mesmo tempo, da sua ordem política de representação.

É a geração do fim do mundo como o conhecemos, e da ditadura da individualidade.

É tudo ao mesmo tempo agora!

Montar um capital político dentro deste contexto não é algo fácil, ainda mais em meio a pandemia, que pode ser colocada como o maior evento histórico deste início de século, e dentre os mais importantes da Humanidade em todos os tempos.

A oscilação do atual Prefeito com relação às suas responsabilidades diante do quadro sanitário de catástrofe, ora parecendo que vai endurecer e agir como gestor público, ora pendendo para ceder às pressões dos necro-comerciantes, ou melhor dizendo, os mercadores da morte, é em parte fruto de sua compreensão geracional de mundo, além, é claro, de seus compromissos e interesses políticos.

Eu torço muito para que tais interesses se alinhem à esquerda, embora eles pareçam muito com o viés liberalismo-popular-evangélico praticado por seus pais, com algumas modernizações de estilo.

O pânico da impopularidade, o receio de "desgostar" a todos, ou pior dizendo, a tentativa ingênua de querer agradar a todos, a incompreensão (confusão) do significado de um gesto democrático do diálogo, e assim de entender a impropriedade de chamar ao debate quem não poderá contribuir com mais nada que seus próprios mesquinhos interesses, é resultado desta inexperiência geracional.

Este "assembleísmo" nunca trará soluções e conforto político, porque o dilema ali debatido é falso, pois não há economia sem gente viva, e porque neste caso de suprema emergência, o poder público não pode perguntar o que fazer, ele tem que saber o que fazer, e fazer, ponto final!

Se errar ou acertar, assuma e aceite as consequências, mas a "terceirização" do risco não cabe neste contexto trágico que a cidade vive, e principalmente porque o setor dos mercadores da morte não vai assumir nenhum ônus quando os corpos estiverem dispostos nas ruas, como aquele cenário deprimente do Equador (Guayaquil), no ano passado.

Aqui esta viagem de 98 dias pela planície faz uma inflexão do campo pessoal-político do Prefeito para o campo geral de análise.

Tudo isso que dissemos aí em cima está mergulhado no cataclismo mundial trazido pela hegemonia brutal das finanças sobre a realidade produtiva.

A gestão das cidades é um micro-universo que nos revela que não há saída próxima, e talvez nenhuma saída possível.

Os orçamentos públicos estão estagnados em um círculo, ou quem sabe uma espiral, quando os setores produtivos não conseguem responder para gerar emprego e renda, e por conseguinte, tributos, demandando mais e mais os parcos recursos públicos, que se esvaem dia-a-dia, trazendo para o ralo o tecido social.

Por certo a pandemia agravou o quadro e acelerou seus efeitos, no entanto, o cenário já nos rondava há tempos.

Não há mais pactos "sub-keneysianos" possíveis para o capitalismo de periferia onde estamos.

Aquilo que chamavam de democracia, e nunca foi de verdade, porque nunca deu chance a qualquer projeto político que ousasse alterar os rumos do capitalismo, esta encenação representativa virou uma arena de ruídos, onde todos gritam e ninguém apresenta nenhuma razão!

Ou seja, se a "democracia" era algo falso, mas tolerável, o que vivemos hoje é insuportável e incapaz de solucionar os embates que vêm por aí, restando espaço apenas para soluções de força.

Não há mais dinheiro "novo", só há dinheiro, e ele está concentrado nas mãos do 1% dos ultra-mega-super-ricos do planeta, que reúnem a riqueza maior que a acumulada pelos 99% restantes.

Dentro deste 1% de super ricos, 10% deles acumula mais da metade da riqueza dos outros 90% dentro desta camada destes super ricos.

Nenhum arranjo tributário hoje consegue alcançar politicamente e economicamente este patamar de concentração.

O resultado?

A tempestade perfeita, tudo em nanosegundos, ao vivo, em rede neural universal, onde cada unidade pessoal (ser humano) é uma bomba relógio de frustrações e de demandas sem perspectiva de qualquer futuro.

Como cantou Gilberto Gil: "antes mundo era pequeno, porque terra era grande".

Parabolicamará.

Antes mundo era pequeno
Porque terra era grande
Hoje mundo é muito grande
Porque terra é pequena
Do tamanho da antena parabolicamará
Volta do mundo, camará
Mundo dá volta, camará
Antes longe era distante
Perto, só quando dava
Quando muito, ali defronte
E o horizonte acabava
Hoje lá trás dos montes, den de casa, camará
Volta do mundo, camará
Mundo dá volta, camará
De jangada leva uma eternidade
De saveiro leva uma encarnação
De jangada leva uma eternidade
De saveiro leva uma encarnação
Pela onda luminosa
Leva o tempo de um raio
Tempo que levava Rosa
Pra aprumar o balaio
Quando sentia que o balaio ia escorregar
Volta do mundo, camará
Mundo dá volta, camará
Esse tempo nunca passa
Não é de ontem nem de hoje
Mora no som da cabaça
Nem tá preso nem foge
No instante que tange o berimbau, meu camará
Volta do mundo, camará
Mundo dá volta, camará
De jangada leva uma eternidade
De saveiro leva uma encarnação
De jangada leva uma eternidade
De saveiro leva uma encarnação
De avião, o tempo de uma saudade
Esse tempo não tem rédea
Vem nas asas do vento
O momento da tragédia
Chico, Ferreira e Bento
Só souberam na hora do destino apresentar
Volta do mundo, camará
Mundo dá volta, camará
Volta do mundo, camará
Mundo dá volta, camará
Volta do mundo, camará
Mundo dá volta, camará
Volta do mundo, camará
Mundo dá volta, camará









 

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