quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

Trump tem razão: está apenas começando!



Seria improvável a um morador da colônia do Império falar de outro assunto na data de hoje, senão a transferência da presidência na metrópole.

Antes de tratar dos argumentos do texto e dos seus desdobramentos, vamos à algumas observações preliminares.

Afastemos a percepção nublada e distorcida dos meios de comunicação de massa, preocupadíssimos com as etiquetas da transmissão do cargo, expondo naqueles ridículos infográficos as imagens das outras todas transmissões passadas, exaltando os modos cordiais que refletiam uma democracia vigorosa.

Primeiro é bom que se diga, ao mesmo tempo que mantêm uma certa urbanidade, vinculada a diversos protocolos, os EEUU foram o país que, reivindicando serem democratas, mais mataram e tentaram matar presidentes na História.

Ao mesmo tempo, a trajetória de sua "democracia" é sempre parecida com as demais no campo ocidental (e capitalista):

Mantiveram-se censitárias (só votava quem tinha grana ou propriedades) por um grande tempo, afastaram negros e outros indesejados por outra parcela de tempo, e só recentemente parecem incorporar (muito a contragosto) estes contingentes menos favorecidos.


Então não nos parece estranho que aquilo que é chamado pelos vira-latas de redação como a "maior democracia do planeta" tenha uma cerimônia de transmissão de cargo da presidência em uma cidade sitiada por 25 mil soldados e policiais, enquanto a população encontra-se trancada pelos efeitos da guerra sanitária que matou 400 mil estadunidenses, ou mais de 100 atentados de 11/09.

Sim, é só o começo.

Olhando o histórico recente das eleições nos EEUU, o país parece (e é) um pêndulo, que oscila do conservadorismo mais radical até um conservadorismo de centro (democrata), pois vejamos:

Depois de Reagan/ Bush Pai, este aqui inaugurando a série war for oil (guerra pelo petróleo), com o primeiro ataque a Saddam Hussein em retaliação a anexação dele do Kwait, veio o moderado Bill Clinton, que apesar de moderado manteve a mesma agenda externa e interna de endurecimento, seja com as catastróficas intervenções na Guerra dos Balcãs, Haiti, etc, ao mesmo tempo que exarcebou toda a base jurídica para a escalada de aprisionamento de pretos e latinos pobres, na versão doméstica de war on drugs (guerra às drogas).


Para se ter uma ideia da intensidade desta agenda, foi nesta época que nós, os macacos de imitação dos EEUU, aprovamos no governo de FHC (e do nosso então czar anti-drogas, Walter Fanganiello Maierovitch) a maior aberração jurídica que se tem notícia:

A Lei do Abate (Lei 9614/98), que permite que aviões das FFAA nacionais, após um protocolo de comunicações com aviões invasores do espaço aéreo, atirem e derrubem estas aeronaves, não importando se houver outros passageiros que não tenham vínculos com a atividade ilícita suspeita (drogas), e pior, instituindo a pena de morte no país, sem que sequer haja um devido processo legal para tanto, bastando a pilotos e redes de controle decidirem o se matam ou não o suposto invasor.


Bem, voltando a vaca fria, depois de Bill, o "pinton", retorna a dinastia Bush, desta vez com o júnior, e aí a turma neocon (os falcões) tomam conta de cada aspecto institucional da vida dos EEUU, alimentados pela histeria pós 11/09, que casou perfeitamente com os interesses do vice Dick Cheney, conhecido "carinhosamente" como Darth Veider.

Bush Jr deu lugar a Obama, que apesar de carregar em sua cor de pele as tintas de esperança de alteração do estamento dos EEUU, não foi além do feijão com arroz, possibilitando o surgimento, ou melhor, a eclosão do ovo da serpente, chocado no pós 2008 (crise subprime), o Trump.


Na verdade, apesar de sentir o momento, e ter uma percepção quase que animal do processo histórico que o cerca, Trump talvez tenha errado na definição do "começo", porque eu acho que o começo foi bem lá atrás, mas sua sensibilidade em capturar esta narrativa explica boa parte de seu resiliente e enorme capital político.

E pouco importa se ele será o beneficiário deste capital político, pode ser outra figura, ainda mais bizarra.

O fato é que estamos em um período de transição, onde as bases materiais do capitalismo que conhecemos, como produção, emprego, geração de renda, indústrias já não conseguem justificar a circulação de enormes quantias de ativos financeiros, senão para lhes dar as últimas gotas de acumulação que serão sorvidas nos buracos negros financeiros, a dimensão dos derivativos.

Um exemplo claro desta etapa, aqui na periferia, foi o fechamento das plantas da Ford, quando esquerda e direita se estapearam nas redes sociais, cada qual demonstrando maior desconhecimento do que de fato está acontecendo.

O mundo está deixando de ser um mundo físico (das coisas), para se tornar um lugar onde as redes digitais controlam pessoas e sua sociabilidade, ao mesmo tempo que aquilo que era produção de bens (e propriedade) vai perdendo sentido para uma ampla gama de serviços controlada por ativos e fundos financeiros que se movimentam à velocidade dos feixes de luz nas fibras óticas.

As plataformas de transporte, onde a Uber foi uma das pioneiras, junto com outras plataformas de habitação (Air Bnb, por exemplo), entregas (Ifood e outras), de compras, de busca, produção de entretenimento, etc, etc, etc, se alinham ao oceano de títulos derivados de outros títulos, que por sua vez derivam de outros títulos, e que negociam cada aspecto destas relações.

Recentemente a água passou a esta categoria de ativo.

Teremos o ar?

O tempo?

Tem um filmizinho muito chinfrim com Justin Timberlake, O Preço do Amanhã, onde o personagem título, e seu par romântico, vivem as voltas em sobreviverem e lutarem contra as elites que criaram um mundo onde todas as pessoas têm a mesma aparência jovem, e não envelhecem após os 25 anos.

As suas vidas e o tempo de sobrevivência após esta idade são controladas, vendidas e dadas aos trabalhadores como horas de sobrevida.

As punições também consistem em retirar horas de vida.

Enfim, desde 2008, há o que se costumou chamar de crise, que insiste em manter seus efeitos, mesmo que governos do mundo tenham disponibilizado trilhões de dólares (quantitative easing) aos bancos e aos sistemas financeiros, seja pela aquisição de títulos, seja pela entrega direta mesmo de papel moeda às instituições.

Parece um poço sem fundo?

E é.

Os enormes valores alocados não conseguiram, nem de longe, reestruturar as produções nacionais, gerando dinâmicas econômicas capitalistas eficientes, ao contrário, foram absorvidos pelo mercado financeiro, que "resetou" o sistema e passou ao novo ciclo de alavancagem.

Neste mundo líquido e de liquidez extrema, nem todos os subsídios do planeta, nem toda boa vontade dos trabalhadores brasileiros em cortar seus salários, enfim, nem todas as facilidades salvariam a Ford do seu destino fatal no país, somente adiariam este desfecho por uns 5 ou 10 anos.

O resultado direto deste adiamento seria a dilapidação das cidades onde se instala, já que com a diminuição dos salários, com a ampliação dos incentivos, haveria a simultânea escalada da demanda por serviços públicos com a incapacidade dos orçamentos públicos em fazer frente a tal demanda.

É mais ou menos este o cenário enxergado por Trump, que gostemos ou não, conseguiu dominar todos os cenários, pois vocaliza as reclamações dos deserdados pelo sistema produtivo, e na outra ponta, oferece ao "novo mundo" pós-capitalista a polifonia polarizada ou a histeria verbal necessárias às oscilações permanentes das instituições políticas antigas, e claro, aos fluxos de mercados que se movem especulativamente ao sabor destas idiossincrasias digitais.

Hoje, os EEUU são a fiel representação (mais uma vez) do mundo:

Uma suposta racionalidade (que de racional nada tem, apenas é passividade) presa e refém da "Diluição Incorporation".

São 400 mil mortos dentro da "maior economia* e democracia" do planeta) e total passividade.

Guerras sanitárias se somam aos outros flagelos de destruição em massa.

Quando um presidente, um líder consegue sair ileso e livre deste desastre que não só ele mesmo ajudou a aumentar, como ainda lançou declarações dignas de um psicopata, o fato é que ele apenas simboliza um estranho e mórbido consenso, onde o individualismo social chega a aceitação de que estas mortes sejam "inevitáveis", como um salto evolutivo, ou como gostam os economistas, destruição criativa.


Joe Biden é o primeiro presidente prisioneiro da História.

Até que as presidências deixem de existir como conhecemos.


 (*) Bem, hoje é a China.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Há males para os quais não existe vacina, nem remédio.

 Na sexta-feira passada, recebi uma indicação de texto do blog do José Alves Neto, e ali pude comprovar, para minha tristeza, que mais uma vez eu tinha razão sobre a tão alardeada "crise" orçamentária de Campos dos Goytacazes.

Em resumo, as constatações do blogueiro indicam que a cidade destinou 200 milhões,  isso mesmo, 200 milhões de seus orçamentos entre 2016 até 2018.

Como os números de 2019 e 2020 não foram atualizados no IBGE, a presunção é de que outros tantos milhões tenham sido transferidos a rede contratualizada, que é o nome ou apelido que eles (os famosos gestores) dão a privatização da rede pública de saúde.

Ou seja, mais uma vez fica claro que dinheiro há, a questão é para quem está indo o dinheiro.

Não vou incorrer na leviandade de requentar suspeitas baseadas no histórico recente das chamadas redes contratualizadas ao redor do país, quando foram submetidas às ações de fiscalizações dos órgãos responsáveis.

Tais escrutínios demonstraram condutas ilícitas das mais variadas, desde a dupla cobrança dos procedimentos (cobra do paciente, nas chamadas consultas ou exames "sociais" e do SUS), cobranças ao SUS por internações e procedimentos falsos, compras superfaturadas, etc, etc, etc. 


A minha preocupação, em tempos de pandemia, e de toda esta histeria fiscal na cidade, é sobre o uso efetivo do dinheiro e os resultados que geram.

Sim, pois estes "gênios da gestão" desfraldam as bandeiras da "eficiência" e "capacidade" do setor privado, blá, blá, blá, e quando nos aproximamos dos números, dos resultados, os que encontramos são sempre...pífios.

Nem vou falar do que não encontramos.

Na verdade, a percepção que temos é que o uso deste dinheiro na rede privada não trouxe resultado esperado, pois as demandas no setor de saúde pública campista são dramáticas.

Ao mesmo tempo que impediu, ou melhor dizendo, diminuiu drasticamente a capacidade do poder público em adotar soluções próprias para o atendimento do público.

A narrativa para justificar tais opções (POLÍTICAS) é sempre a mesma:

- O setor público é deficiente, principalmente no campo das médias e altas complexidades, como são chamados os procedimentos eletivos, exames e outros atendimentos e acompanhamentos de longo prazo aos pacientes crônicos.

E qual a solução adotada pelos "gênios da gestão"?

Dotar o setor público de mais verba e inverter a curva de privatização?

Não, ao contrário:

Eles sucateiam mais e mais o setor público e alocam mais e mais verbas ao setor privado.

É como dizer ao doente que ele está morrendo de câncer no pulmão pelo tabagismo, enquanto lhe prescreve como tratamento uma ou duas carteiras de cigarros por dia.

Com a atual conformação do poder municipal recém eleito, o que era apenas uma aliança política pode ter se transformado em compadrio mesmo.

Mesmo que eu acredite em todas as boas intenções do recém eleito prefeito em auditar o setor, buscando transparência para saber qual o resultado de cada real empregado no setor, e que ele realmente deseje e pense em como fazer para interromper esta relação comprovadamente ineficaz do setor público e do setor privado de saúde, não enxergo chance desse processo acontecer.

E lhes digo o porquê:

O prefeito tem ao seu lado, com poderes institucionais inéditos para um vice, justamente o representante dos hospitais privados, que ainda emplacou o secretário de saúde municipal.

Como é que se dará esta equação política?

Simples. 

Não se dará, e seguiremos assistindo mais e mais depredação do setor público em favor dos hospitais privados.

Querem um exemplo de como as coisas funcionam?

Por que os hospitais privados não atuam nas redes de emergência/ urgência?

Ora, porque tais estruturas não dão lucro, são extremamente complexas e sensíveis.

A exemplo dos planos e empresas de seguros de saúde, tais redes contratualizadas deixam este lado caríssimo do atendimento de saúde ao setor público.

Enfim, acreditando em papai noel, e em outras lendas, caso o prefeito eleito queira testar as fidelidades do vice e do seu secretário de saúde a ele (prefeito), seria bom perguntar aos dois, já que oriundos do setor, e detentores de enorme trânsito por ali:

- Qual foi o quantitativo de procedimentos realizados pela rede contratualizada desde 2016 até 2020?

- Quanto cada entidade recebeu do Fundo Municipal de Saúde?

- Qual a natureza dos atendimentos (exames, cirurgias, consultas, etc)?

- Quais os valores empregados em aquisições de bens, insumos, serviços, etc, no período?

- Quais foram as receitas privadas e oriundas do FMS das entidades no período?

- Há caixa contábil separado para as contas SUS e a gestão privada dos hospitais?

- Quantas auditorias foram realizadas no período em cada entidade, entre 2016 e 2020?

- Há profissionais servidores públicos dando expediente nestas entidades, como são calculadas suas horas de trabalho em relação às suas matrículas públicas, como é feita a fiscalização para impedir que trabalhem para as redes privadas, recebendo do setor público?

- Os procedimentos realizados pela rede contratualizadas estão vinculados aos SISREG?

Bem, eu acho que o prefeito não vai querer fazer perguntas tão inconvenientes ao seu vice e ao eu secretário de saúde.

Quem sabe?

Esperança pode ser remédio ou placebo.






quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

De como são feitas as bananas, as salsichas e a democracia estadunidense!

 


Frisson geral na grande mídia corporativa e seus filhotes regionais e locais.

O sacrossanto lar da democracia foi conspurcado por um bando de lunáticos, instigados pelo seu líder, que reage e resiste a entregar o governo conforme as regras conhecidas.

OEA em cólicas, Globo News consternada, ex-embaixadores, analistas e toda sorte de neófitos de plantão.

Saldo da contenda: 4 mortos.

O que será de nós agora?

Quem irá nos salvar de nós mesmos, aborígenes das republiquetas de bananas, como disse o Bill "Pinton", o assediador do Arkansas, ao nivelar o episódio com outros da geopolítica latina?

Nós, os incapazes de existirmos que somos, sem a tutela dos Patróns del Norte ?

É o fim, senhores, parece o fim. Será?

Bem, vamos com calma e aos pedaços, como disse Jack, O Estripador.

Primeiro parece muito estranho que o Capitólio estivesse vulnerável à invasões, quase que como  um convite, sabendo as autoridades de lá que a horda de "red necks" enchia as ruas da cidade, alimentados pelo ódio, e carregando as tochas do fogo insano das plataformas digitais.

Os caras são capazes (e se dizem capazes) de investigar e monitorar o movimento, o cheiro, consistência, amplitude e duração de um peido comunista em Marte, mas não conseguiram prever o risco do que estava para acontecer, e aconteceu?

Deixemos as conspirações de lado. Elas podem ser verdadeiras.

Eis que o "berço da Democracia Ocidental", "Os Campeões Morais do Mundo", enfim, a matriz de toda subserviência estrutural e ideológica, que está no DNA de nossas elites, nossa classe média e da mídia, está, afinal, em palpos de aranha com as suas disputas representativas.

Perguntam todos estes órfãos dos EUA se os Republicanos conseguirão se reerguer, se o sistema de lá resistirá a tal solavanco, se os Democratas serão capazes de lidar com a frágil hegemonia recém conquistada nas urnas?

Esta posição majoritária no Congresso foi confirmada com as eleições para as vagas no Senado no Estado da Geórgia, o novo "queridinho" da "Primavera Democrática Black Lives Matters", que mostra que, no fim das contas, há esperança.

Pausa para risos: (risos).

É hora da necropsia na hipocrisia:

Os EUA, desde 1776, nunca foram o que se pode considerar um sistema representativo universal, já que o voto era direito submetido às condições censitárias, e depois, com o passar do tempo, muiiiiiiiiiiiiiito tempo, até 1968, negros foram sistematicamente impedidos de votar, ao mesmo tempo que eram pendurados pelos pescoços, cujos corpos carbonizados e espancados funcionavam como macabros adornos da sociabilidade sulista.


Esta celebrada "democracia" matou 600 mil pessoas em uma guerra fratricida de 5 anos, só porque um presidente ELEITO (Abraham Lincoln) achou de exercer seu mandato e libertar os escravos.

Detalhe, esta Democracia, após a derrota do Sul, matou este presidente, e inaugurou esta estranha "mania democrática" deles de praticar tiro ao alvo presidencial.

Recentemente, após anos e anos de luta contra as medidas para dificultar o voto naquela Democracia, o "Supremo com tudo" deles voltou a liberar as leis estaduais que permitem tais alterações (gerrymandering), que no fim é um tipo de voto de cabresto um pouco mais sofisticado, algo como uma Banana Sundae.

Nossos bananinhas choram o fim do American Dream, mas não sabem dizer porque todas as vezes que governos progressistas ou de esquerda chegaram aos governos através de eleições, tudo no figurino dos EUA, mesmo assim esse Grande Irmão do Norte achou que deveria patrocinar golpes truculentos e sanguinários, que atualmente ganharam um pouco mais de "civilidade" chamada lawfare.

Precisamos mencionar também que esta "mais antiga democracia do planeta" elegeu um presidente (Bush Jr) pela fraude eleitoral perpetrada pelo seu irmão Governador da Flórida, lá nos anos 2000.

A partir daí, o Darth Veider, como era chamado o Dick Cheney e sua quadrilha, assaltou o poder, instituiu vigilância completa pela NSA, com o uso do Programa PRISM, denunciado pelo seu criador Edward Snoden, que passou a espionar dentro e fora dos EUA.

Esta ferramenta foi usada até pelo bom Pai Tomás Obama contra Dilma e a Petrobrás.

Eu sei, eu sei, 11 de setembro foi um trauma para todos os bananinhas ao Sul do Rio Bravo, e para o Grande Sul dos EUA, que vai do Maine até a Califórnia, embora os sociólogos (argh) insistam em dizer que o sulismo é coisa de Alabama, Lousiana, ou Texas.

Sim, um grande trauma que a tudo justifica, certo?

Nem tanto.

Hoje morrem por lá, vítimas da execução sanitária programada capitalista de excedente de pobres, diariamente, um 11 de setembro.

Aqui, modestos que somos, matamos uns três aviões, ou algo em torno de 1000 pessoas dias.

Indignação? Medidas drásticas? Passeatas? Convulsões de tristeza coletiva?

Nenhuma.

Nem 0,20 centavos?

Vem pr'a rua?

Quem matou 198 mil conterrâneos de Marielle?

Então vamos combinar e dizer de forma bem suave, para não assustar o pessoal que acredita no American Way of Life:

Nunca houve qualquer traço de democracia por lá, e quando tentamos copiar eles aqui embaixo, eles vieram lá de cima e nos enfiaram o Big Stick ou uma...banana.

Feliz era Carmen Miranda, que apenas as levava na cabeça.




Banana, como vemos, é fruta que dá em muitos lugares.

Idiotice também.

Mas não perguntem, como no caso da piadas das salsichas, como nascem os idiotas, e como são criadas as Repúblicas das Bananas.




PS: Não se surpreendam se toda essa celeuma obedecer a um roteiro cínico que permita a extrema-direita manter algum capital político, enquanto a direita que come com talheres avisa: 
"Viram?" "Se vocês não se comportarem direitinho, e ousarem ir um pouco mais para esquerda, nós chamamos o Bicho Papão do Sul".

 














quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

"A cidade não para, a cidade só cresce, o de cima sobe, e o debaixo desce" (Chico Science in A Cidade).

 





Acho que as ilustrações do Genildo, aí em cima, e do Angeli lá embaixo, são auto-explicativas.

Porém  não custa nada acrescentar alguns pleonasmos à estas poderosas narrativas gráfico-visuais.

O prefeito eleito e recém empossado da cidade de Campos dos Goytcazes cumpre seu roteiro com exatidão e monotonia:

Diz que encontrou tudo arrasado, que lhe resta pouca margem para manobras mais ousadas, e conclama todos ao trabalho árduo, sacrifícios, e claro, ao consenso (chamado de "Paz").

Sabemos todos que estes métodos estão mais para construção de "Pax" a verdadeira pacificação ou  melhor dizendo, na busca por uma diminuição dos conflitos advindos da desigualdade.

O problema central da lógica (?) do prefeito e do seu grupo político, que mais parece uma reedição piorada das gestões de sua mãe, com cacos e escombros da gestão anterior (muito por força dos acordos no Legislativo, é verdade), é que a desigualdade em si não lhes incomoda, pelo menos não a ponto de provocar neles qualquer tentativa de diminuir tal flagelo social.

As medidas compensatórias limitam-se a colocar band-aids em hemorragias.

Já dissemos em outros textos que a tese de que 20 bilhões de reais em orçamento foram desperdiçados é uma tolice, e que por certo, qualquer análise acadêmica, superficial que seja, nas curvas de concentração de renda e pauperização, ou até de uma simples investigação nos cadastros imobiliários da prefeitura em sua base de arrecadação do IPTU, vão revelar o tamanho do abismo cavado com a força de 20 bilhões.

Estranhamente nenhuma universidade ou nenhum analista de desenvolvimento regional (essa piada conceitual de péssimo gosto) se debruçou sobre este tema.

Estranho não?

Pois é.

Então, a cantilena da "crise", da falta de recursos, etc, e etc, podem até conter uma parte da verdade, o que na realidade ajuda mais a torná-la uma mentira inteira.

Sem uma dramática alteração na base de arrecadação tributária da cidade, com a distribuição do ônus maior aos que mais podem arcar com ele (os mais ricos), justamente aqueles que foram os maiores beneficiários do "desperdício" (risos) dos royalties, pouco ou nada a prefeitura poderá fazer.

Principalmente porque este não é um fenômeno local, embora eu até gostasse de colocar toda a culpa nas costas dos grupos políticos e seus sócios que sugaram os orçamentos públicos até as últimas gotas.

Este é um processo global e amplo, quando o que resta de capitalismo de terceira revolução industrial possivelmente vai prescindir de largas multidões de trabalhadores e sub-trabalhadores, com realinhamento dos centros restantes de manufacturas em novos arranjos locais (geografias), que por suas vezes terão que oferecer tamanha exploração das forças laborais residuais que nem se saberá ao certo se vale mais a pena manter tais empregos.

Para quem deseja uma visão do que falo, olhe bem para o Sudeste Asiático e Oriente Média, ou a África.

Vou dar um exemplo, que também serve aos moralistas:

Há um surto de produção, tráfico e abuso (dependência) de metanfetaminas no Sudeste Asiático, Indonésia e arredores, causado pela demanda dos trabalhadores que cumprem 18 horas de trabalho, para obterem um pouco mais de recursos para somar rendas que não ultrapassam 10 dólares por dia.

Metanfetaminas são drogas que mantêm seus usuários em alerta, sem sono, fome ou fadiga.

Não é difícil imaginar que recaem sobre as prefeituras e governos locais todas as demandas de saúde, transporte, segurança, enfim, de toda as infra-estruturas necessárias para suportar estes arranjos produtivos que exaurem trabalhadores, que depois se amontoam nos hospitais, cadeias e transportes públicos.

Seja no Norte Fluminense, seja em Hong Kong.

No caso da cidade de Campos dos Goytacazes, com pouca ou nenhuma dinâmica econômica, e dependente exclusivamente das receitas públicas e dos salários dos servidores que sustentam o consumo e o terceiro setor (comércio de bens e serviços), seria engraçado, caso não fosse trágico, ouvir e ler os discursos de empresários e da classe política dirigente fazendo a população crer que poderão instalar dinâmicas produtivas aqui, e que tais arranjos serão capazes de dotar a cidade de certa autonomia econômica.

Mesmo que isso fosse possível, a instalação destas estruturas por si mesmas não garantiriam nada, senão mais e mais desigualdade e pressão nos serviços públicos, caso fossem mantidas as estruturas tributárias atuais.

Simultaneamente é também cômica a tentativa de apertar ainda mais o garrote sobre os bodes expiatórios preferenciais: os servidores públicos.

O servidor é uma espécie de Geni, boa de xingar, boa de cuspir.

Uma cidade que vive de comércio e quer retrair ainda mais a principal base de consumo parece suicídio. 
E é.

Em pouco tempo, o novo prefeito vai ter que enfrentar outro grande problema.

Sem reajuste há anos, o equilíbrio autuarial previdenciário, que já é quase uma ficção, vai desabar de vez, pois sem aumento das receitas do PreviCampos, já que os servidores que acumulam perdas pagam menos ao fundo, o buraco previdenciário aumentará cada dia mais.

Certas verbas do Governo Federal exigem a certidão de regularidade previdenciária (autuarial), e em breve Campos dos Goytacazes a perderá.

Já aconteceu na cidade vizinha Macaé, inclusive com judicialização da questão para responsabilização do gestor.

Você me perguntará, como fazer?

Eu te respondo fazendo outra pergunta:

Para onde foram a maioria dos recursos de royalties recebidos?

Não, não responda com "desperdício" ou "desvio".

Vamos tentar criar uma ilustração de texto:

Imagine 20 bilhões de litros d'água.

Essa água estava em uma grande cisterna, que enchia todos anos.

Deste cisterna havia dutos da espessura de uma garrafa "PET" que irrigava as casas dos mais pobres, enquanto para as casas dos mais ricos os dutos tinham 2 metros de diâmetro.

Claro que todo este sistema tinha vazamentos no caminho, mas certamente você será capaz de imaginar que o vazamento não é o principal problema, mas sim a distribuição.

Então, está na hora de mudar este sistema de distribuição e fazer com que aqueles que tiveram maior abastecimento, agora paguem a conta dos danos causados por esta desigualdade.

A única chance, e remotíssima, de minorar ou mitigar os danos das alterações estruturais que estamos sofrendo não é com as receitas criminosas de aumento de incentivos fiscais, retração salarial de servidores e cortes em programas sociais.

Ao contrário, é permitir a municipalidade, através do confisco das riquezas concentradas, de adquirir bens e serviços e aumentar o poder de compra dos servidores, criando uma demanda local capaz de dar algum fôlego, ainda que temporário à cidade.


Caso contrário, o desenho aí de cima vai ganhar contornos cada vez mais trágicos e reais.



segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

A salvação da lavoura dos "meninos de engenho".

 



Talvez seja o fato de eu ter sido criado em uma cidade onde a monocultura sucroalcooleira tenha prevalecido como atividade econômica por séculos que tenha me empurrado para a obra de José Lins do Rêgo.

O autor foi injustamente catalogado como "regionalista", justamente pela sua imensa contribuição para a literatura universal ao descrever com rara precisão o locus deste setor agrário e semi-industrial, no caso dele, no Estado da Paraíba.

Apesar de todas as referências serem regionais, as obras associadas ao "ciclo da cana do açúcar", dentre as quais li Menino de Engenho, Usina e Fogo Morto, junto com outras que tratam de outros temas, como Água Mãe, Pedra Bonita, Eurídice, na obra de "Zé Lins" estão todos os elementos universais humanitários: opressão de classes, crendices, superstições e o poder da Igreja, a subordinação cultural imposta aos mais pobres pelos mais ricos, etc, etc, etc.

Fiz esta introdução para tratar de assunto que parecia de "fogo morto" na região da planície goitacá, mas que recentemente ganhou nova força política e de narrativa, a partir de uma engenhosa (re)construção de mitos e imprecisões.

Falo da atividade monoculturista da cana de açúcar, que de tempos em tempos, após sua conhecida decadência local e regional, insiste em se apresentar como "solução econômica" para substituir a outra dependência atual e também decadente, a da monocultura extrativista dos hidrocarbonetos, que legou à cidade e suas vizinhas um oceano de royalties.

Já mencionamos aqui a primeira armadilha discursiva das elites parasitárias da cidade e da região, que infelizmente é reproduzida e repercutida por alguns acadêmicos e outros analistas bem intencionados, dentre os quais não me excluo, porque já comunguei com esta versão:

A do desperdício, a da "gestão perdulária" dos royalties, ao mesmo tempo que imputa à classe política (exclusivamente) a responsabilidade pelo desvio ou o mau uso destes recursos.

Está aí uma mentira contada um milhão de vezes, que parece ter assumido ares de verdade.

Um exame mais complexo da questão (que nunca foi feito) nos diria que os royalties aplicados nos chamados "elefantes brancos", ou em projetos desnecessários não somariam nem 10% dos valores recebidos pelas cidades.

Sim,  isso é um chute.

Ao mesmo tempo é uma provocação para que se faça este estudo, porque os cientistas e analistas políticos também não detêm número algum que valide mais o chute deles do que o meu, diga-se.

Digamos então, de forma exagerada, que foram 50% dos valores ou seja, 10 bilhões de reais empregados em estádios, centros de convenções, passarelas do samba, e outros "coliseus modernos".

Incluamos aí nestes 50% os projetos de segurança alimentar e renda social chamados pelas elites de "populismo".

Não, não, não...eu tenho certeza que 10 bilhões não foram para estes projetos, nem que eu incluísse nas contas os projetos habitacionais.

Então onde foi parar essa dinheirama?

Uai, no bolso das elites locais e outras de outros lugares que vieram até Campos dos Goytacazes e região para sugarem até a última gota, deixando para trás só o ônus, representados em inchaço das cidades (não é o caso da cidade campista, mas sim de Macaé, Rio das Ostras e Cabo Frio, por exemplo), aumento da demanda por serviços públicos, e uma base de arrecadação reprimida pelos tempos de bonança orçamentária, que justamente beneficiou, outra vez, os mais ricos, que deixaram de pagar impostos como deviam.

Nem vou detalhar muito esta análise, porque estudos também deveriam entender quanto de tributos retornaram da aplicação destas verbas indenizatórias (royalties), o que diminuirá em muito a tese do "desperdício", e/ou comprovará que nossa estrutura tributária protege sempre os mesmo: os mais ricos.

Deixemos isso de lado, por enquanto.

Vamos ao fato de que as elites regionais gritam, agora e novamente, que a saída é nossa vocação agropecuária.

Sei...

Como se esta "vocação" já não nos tivesse deixado um rastro de desigualdade, racismo e violência estrutural fundiária desde o século XVI até o final da década de 90 do século XX, quando as últimas usinas de cana-de-açúcar fecharam as portas.

Dados que não podem ser esquecidos pelos defensores da atividade:

Campos dos Goytacazes foi uma das últimas cidades do Brasil a abolir a escravidão, e considerando que o Brasil foi o último país a fazê-lo, estamos na categoria dos últimos do mundo.

Mesmo assim, já em pleno século XX, a cidade e a região mantiveram a forte "tradição" de escravizar gente, figurando como foco importante desta modalidade de trabalho nos cadastros oficiais dos órgãos repressores.

E por que escravizavam gente entre 1980/2000? Faltou dinheiro?

Não, como região fartamente agraciada com incentivos fiscais dos governos militares (talvez porque ajudaram a queimar em seus fornos os corpos dos militantes de esquerda), recebemos milhões de dólares para dinamizar a produção de etanol para abastecer o programa de energia automotiva chamado de Pró-Álcool.

Bem, se dinheiro nas mãos destes "empresários" trouxesse algum bem à cidade e a região, nós seríamos o paraíso na Terra.

Imaginem o paraíso deixado pelas usinas em 1990 encontrando o paraíso do petróleo das décadas seguintes?

Pelo que sabemos, não foi bem assim.

A vocação maior dos usineiros locais, e dos grandes produtores rurais a eles associados sempre foi a pilhagem, a escravização, tudo com dinheiro público, enquanto se auto-elogiam como vanguarda da inciativa privada.

Querem um exemplo?

Na semana passada, 390 mil litros de etanol foram apreendidos na Baixada Fluminense, embarcados em carretas (caminhões-tanques).

A suspeita?

Uma usina da cidade de Campos dos Goytacazes emitia notas fraudadas para permitir a outros empresários usufruírem da redução de impostos, concedida àquela unidade industrial campista como subsídio à produção e geração de empregos!

Ah! Isso é só uma exceção, dirão os defensores do coronelato.

É, talvez.

A julgar pela história de escravagismo e violência do setor, pode ser que crimes fiscais até sejam uma sofisticação excepcional.

Tudo, afinal, é uma questão de ponto de vista.





Quem faz a fama, deita na ca(â)ma(ra)? Um breve momento na Gaiola das Loucas!

  Algo vai muito mal quando juízes e policiais protagonizam política, e pior ainda, quando são políticos que os chamam para tal tarefa... Nã...