quarta-feira, 14 de outubro de 2020

A santíssima trindade: MP, Judiciário e Mídia!

Acerca do Habeas Corpus concedido pelo juiz Marco Aurélio primeiro é bom dizer:

HC, como todo remédio constitucional trata de socorrer os pacientes, pois assim são chamados quem recorre a tais garantias, quando há violação flagrante delas, ou seja, quando alguém tem seu direito violado por agente do Estado e tal violação seja tão explícita que não se necessitam provas ou interpretações!

É o caso do § único do artigo 316 do CPP. 

Ponto e vírgula!

Se o juiz "da causa", aquele que decretou a prisão, não manifestar a cada 90 dias que a situação de fato que deu causa ao confinamento permanece, livre-se o réu, desde que não haja outra ordem pendente (de prisão).

Ponto final!

Qualquer tentativa de "interpretar" o que quis dizer o legislador, ou tratar este ou aquele preso como diferente devido a sua chamada periculosidade insere-se na categoria do abuso (de autoridade).

Quando se trata de prisão preventiva (ou temporária), isto é, de privação cautelar de liberdade, não interessam os réus ou acusados, as suas qualidades, ou neste caso, para ser mais claro, seus defeitos pessoais, a gravidade do delito cometido, etc.

Esta é a regra, ou deveria ser.

Portanto, acertou a facção do garantismo-oportunista do STF, mas isto lhe custou o amor da mídia, que buscou refúgio no colo da facção do populismo-jurídico do STF

As premissas para prisão cautelar preventiva estão esculpidas nos artigos 312 e 313 do CPP.

Assim como estão expressas no artigo 1 º e outros artigos da Lei 7960, adaptadas pela Lei 13869 (Lei do Abuso de Autoridade), as condições para a prisão temporária.

Neste caso último aqui citado (prisão temporária), os prazos dos mandados (05 dias), uma vez expirados, e sem que o juiz se manifeste em contrário (com a renovação da prisão), impõe a imediata liberação do preso por quem o mantém sob custódia, INDEPENDENTE de manifestação de quem decretou a prisão.


Embora cautelares, as prisões temporárias e preventivas destinam-se à preservação de momentos diferentes da persecução, quando a temporária se destina a garantir a efetividade do Inquérito Policial, etapa anterior ao processo propriamente dito.

Já a prisão preventiva, que também pode ser oferecida antes da denúncia (embora sejam raras estas ordens), geralmente têm por objetivo a proteção do processo e sua efetividade.

Feito este preâmbulo, restam tantas confusões que é difícil enumerá-las.

    A pressa oportunista da mídia e seus lacaios em relançarem a pauta da execução antecipada das penas, sob o argumento de que isso impediria que presos perigoso permaneçam livres enquanto aguardam os ritos processuais, é um contrabando típico do populismo jurídico-legislativo e punitivismo penal que nos assola nos dias atuais.

Mais da metade dos presos do nosso sistema judicial-penitenciário é composto hoje por presos preventivos (e temporários), isto é, sem condenação (e portanto, sem penas cominadas aos crimes os quais são acusados).

Nem precisa dizer que a esmagadora maioria destes presos são pobres e pretos.

Uai, mas aí você, punitivista, poderia dizer-me contraditório, pois a lei que permitiria a execução antecipada da pena poderia corrigir estas distorções, trazendo ao cárcere os presos ricos.

Sofisma, sofisma, sofisma, eu repetiria.

Primeiro que não se ampliam direitos com normas mais severas.

A ampliação de direitos e garantias, incluindo aí a efetividade do processo penal, se garante com a universalização isonômica do atendimento judicial às demandas, tratando cada caso em si, dando a cada um o que lhe é justo e dentro proporcionalidade exigida pelas desigualdades entre os atendidos.

Depois é preciso dizer em alto e bom som, nem antes de 2016, quando o STF chancelou a execução antecipada das sentenças, nem depois, quando reverteu esta decisão inconstitucional (e feita sob medida para os tempos eleitorais), havia uma imposição legal ao juiz para obrigá-lo a antes prender os sentenciados por órgão colegiado, ou depois, soltá-los após sentenças destes.

O que a decisão última do STF foi dirigir o entendimento já esculpido na CRFB/88, de que a prisão é exceção, não regra, ainda mais quando na ausência de sentença definitiva.

No entanto, o STF, nem qualquer outra pessoa, como eu, desconsidera que há abrigo na Lei (no CPP) para manter em prisão preventiva aqueles cujos delitos ou condições objetivas se enquadrem nas normas dos artigos 312 e 313 do CPP.

Onde está o problema então?

Ora, caros e poucos amigos leitores, está na brecha concedida pelo CPP quando fala do abalo da ordem pública (paz social) para prender pessoas antes de sentença transitada (artigo 312 do CPP).

Aqui está o nó górdio da questão, que também não foi tocado pela norma que instituiu o § único do artigo 316 do CPP.

Esta margem interpretativa (subjetiva) conferida aos juízes é um poder enorme, e como vemos, tem servido a tudo, menos a garantir a ordem pública ou a paz social, já que a aplicação hierárquica, classista e étnica do dispositivo, manteve nas cadeias os mesmos de sempre!

O dispositivo "discricionário" manejado por Vossas Excelências tem, ao contrário, determinado que a tal "ordem social" possa assim ser descrita, com raríssimas exceções: preto e pobre, preso, rico e branco, solto.

Ou seja, a letra da lei já permite aos juízes uma margem subjetiva para dizerem se consideram a prisão cautelar e preventiva de um autor de furto (ou um reles traficante preso sem armas, e que não tenha antecedentes criminais) mais ou menos significativos à manutenção da ordem pública que um sonegador, que some com um importante documento do processo administrativo (DARF) que poderia levá-lo às barras da Justiça, como os donos de um certo grupo de comunicação lá da Nuncalândia, por exemplo (perigo à instrução penal, um dos requisitos OBJETIVOS da prisão no artigo 312 do CPP). 

Adivinhem quem está preso?

O mal falado § único do artigo 316 do CPP apenas disse que haveria agora um limite temporal (90 dias) para que Vossas Excelências renovassem tais interpretações.

A figura desta limitação temporal é conhecidíssima.

No caso da Lei 7960 (Prisão Temporária) este prazo é de cinco, REPITO, CINCO DIAS, e ninguém notou isso até agora??????!!!!!

Ou seja, o argumento cretino do pato de maringá, de que 90 dias para um juiz (re)avaliar prisões e fundamentos pela sobrecarga é mentiroso, vil e criminoso, já que na própria Lei 7960 este prazo é bem menor.

Meu zeus, é este o pilar, o suprassumo da elite do pensamento judicial brasileiro recente, farol da lava jato, aquele que arrebatou multidões.

No pensar do pato de maringá, impossível o cumprimento da lei pelas pobres Excelências, tão cansadas e esgotadas de ganharem 40 ou 50 mil reais (alguns tantos, 100 ou 150 mil) por mês, com duas férias anuais, recessos, ufa, e mesmo assim, por heroísmo e altruísmo acumulando varas e vencimentos!

(Podem ainda vender 1/3 das férias, mas como? Não estão esgotados???????)

Se era assim tão "pica" das galáxias o preso (André do RAP), e eu acho que era, porque comeram mosca?

Possivelmente, aqueles que dizem que a revogação do § único do artigo 316 do CPP, que retorna ao texto anterior, onde não havia prazo algum para reconsideração ou revalidação dos motivos da prisão, querem é que as coisas continuem as mesmas, ou seja, ricos fora do alcance da Lei, ou de sua aplicação, apesar de vomitarem na mídia que desejam que a "lei seja para todos", e blá, blá, blá...

Explico: sem prazo definido, a arguição que, ressalte-se, pode ser feita a qualquer tempo pela defesa (mesmo depois do primeiro dia da prisão preventiva), depende da capacidade do réu ou do preso em ter uma assistência jurídica que, de forma eficaz, consiga convencer o juiz que os requisitos para manter o cliente preso acabaram.

Bons advogados custam muitos honorários (nem sempre, é verdade), mas defensores públicos, estes sim soterrados pela demanda, nunca conseguirão atender réus pobres na mesma condição daqueles que podem pagar assistência jurídica privada.

Logo, por dedução lógica, o prazo de 90 dias inverte esta lógica monetarista do atendimento judiciário, e ataca vários interesses, ao obrigar que o juiz diga se mantém ou não a prisão.

Esta é a pedra filosofal da questão.

Por outro lado, aposto um quazilhão de reais que se fosse um policial ou agente público, do tipo mortais (não juízes, não promotores) que "esquecessem" de praticar ato de ofício que resultasse na soltura de um acusado desse calibre, ele ou ela já estaria ardendo na fogueira santa da santíssima trindade: MP, Judiciário, e Mídia.

Fica a dica: não seria melhor pagar um terço aos juízes (que já daria algo em torno de 20 mil reais) e triplicar o número de juízes e varas, talvez para nos retirar do incômodo título de um dos judiciários mais lentos do planeta (lento para a maioria, diga-se) e dividir poderes e responsabilidades?

Grandes poderes, grandes responsabilidades, diria o Tio Ben do Peter Parker (Homem Aranha).

Pois é, nossa santíssima trindade, tal e qual a católica, parece nos desafiar sempre a acreditar sem entender.

Como deus é pai e é filho e ao mesmo tempo espírito, Mídia é tribunal, tribunal é órgão legislador, órgão ministerial é o espírito midiático do moralismo sacrossanto, e todos são deuses, todos são um, e uns são todos, e no fim de tudo, não precisam se explicar, apenas serem obedecidos.

Aqui em nosso país, a lentidão e sobrecarga do judiciário é o argumento para...para...? 

Isso mesmo, para criarem leis que atropelem ainda mais os poucos direitos dos réus e do cidadão, judicializando ainda mais os conflitos, e...claro, aumentando a lentidão.

Nosso Judiciário é de uma inventividade sem par, cria dificuldades para vender ainda mais...dificuldades.

Estranho não? Não se você olhar com atenção.

Voltando a carga do assunto principal:

A partir de agora, a facção populista-jurídica do STF vai apelar e bater abaixo no pescoço, onde tudo para eles virou "canela" (no brucutuquês do futebol).

Vai ser chamada a decidir sobre a constitucionalidade de uma nova Lei ou Emenda à Constituição que ataca a própria Constituição naquilo que ela é inatacável, Cláusula Pétrea, quando já emitiram juízos antecipados de valores, sendo assim, de natureza política, muito antes de tais questões lhes serem apresentadas.

Estas cláusulas não podem ser alteradas, salvo em NOVO TEXTO CONSTITUCIONAL, UMA NOVA CONSTITUIÇÃO, e são todas as do artigo 5º da citada Carta.

Veremos a seguir um festival de chutes hermenêuticos, torcendo princípios e garantias, torturando direitos, até que se confessem adeptos às novas versões sugeridas pela santíssima trindade.

Porém, se Luís XIV dizia, L'État c'est moi (O Estado sou eu), os nossos santíssimos dizem: Le Droit c'est moi (O Direito, sou eu).



 

 




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