terça-feira, 3 de novembro de 2020

O Inferno é aqui.

Uma breve olhada no atual cenário pré-primeiro turno em Campos dos Goytacazes nos mostrará que a cidade continua a optar por soluções desastradas, ou melhor, repetidamente desastradas para tratar dos mesmos problemas.

No pleito atual despontam os dois herdeiros de dinastias políticas recentes. 

Não por acaso, uma derivada da outra, já que o Garotismo do candidato em primeiro lugar nas pesquisas é a origem do capital político do segundo colocado.

Em resumo, poderíamos dizer que desde 1988 o modelo de gestão não se interrompeu, e parece que prevalecerá a partir de 2021.

Alguns dirão que houve um intervalo, simbolizado no mandato do atual prefeito (2016/2020), ele mesmo oriundo de outra dinastia política, que supostamente esteve alijada do poder desde 1988.

Na essência, porém, as coisas se mantiveram no mesmíssimo lugar, e ouso dizer que o domínio das elites agrárias e mercantis desta cidade, que depois se associaram a grupos empresariais urbanos (locais, regionais e nacionais), nunca foi, nem de fato, nem de direito, sequer arranhado ou ameaçado.

Diferenças de estilo, de linguagem, ou de acesso às faixas mais pobres da população, a cidade manteve intacta as estruturas de exclusão e hierarquias de classes herdades do modelo sucroalcooleiro, que migraram para a monocultura extrativista de hidrocarbonetos.

Os bilhões de reais que fluíram pela planície goitacá não moveram quase nada a base da pirâmide social, ao contrário, em determinados momentos, os institutos de pesquisa e acompanhamento dos índices de desenvolvimento humano revelam que mesmo no auge do recebimento dos recursos, os níveis de pobreza e desigualdade, inscritos no mais famoso parâmetro, IDH,  colocava a cidade de Campos dos Goytacazes nos últimos lugares dentre os municípios do RJ, e do Brasil.

O período do atual prefeito (2016/2020) não mudou esta direção, ao contrário, aprofundou ainda mais os efeitos desta cruel desigualdade, retirando dos mais pobres qualquer chance de amparo social nos programas mitigadores implantados pelos governos anteriores.

Esta percepção de piora do que era muito ruim traz a população uma nostalgia nefasta, ou seja, recolocar no poder as mesmas políticas públicas que soterraram a cidade.

A academia local e outros agentes políticos reverberam as cantilenas da "má gestão", "falta de responsabilidade fiscal", "corrupção", etc, etc, etc.

Outros avançam um pouco mais e intuem uma chamada falta de vontade (competência) política para interlocução, e/ou para formação de arranjos políticos e econômicos locais de naturezas virtuosas.

Não senhores, nada disso.

O que vivemos hoje não é crise, é projeto, como disse o inesquecível Darcy (Ribeiro).

Durante anos, desde os ciclos do açúcar do Segundo Império, seguido pela chamada época "áurea" das usinas (áurea para quem?), passando por outros micros arranjos locais fracassados (vestuário, alimentos, etc), chegando ao declínio do ciclo do açúcar e a chegada do petróleo, o projeto local sempre foi o mesmo:

Elites locais indigentes se associam às elites regionais e nacionais, e excluem a enorme maioria de pobres e desvalidos, enquanto os setores médios funcionam como "clientes" dos favores estatais, se apropriando da evolução de frágil dinâmica econômica extrativista, apostando em bolhas imobiliárias, e consumo de bens duráveis, enquanto vocalizam sua tradição política de fazer coro à narrativa dos donos do capital.

Esta constatação não se resume aos dois primeiros colocados nas pesquisas de intenções de votos, mas pode ser vista nas demais candidaturas, incluindo aí a do PT.

Nenhum dos candidatos (as) ousou dizer (uns por uma coerente convicção de classe, outros por covardia mesmo) que uma cidade só se sustenta quando os mais ricos pagam mais impostos que os mais pobres, baseado no princípio (CAPITALISTA) de que se os mais ricos são aqueles que mais se beneficiam da desigualdade gerada pela acumulação capitalista, nada mais justo que paguem mais impostos para que os efeitos desta desigualdade sejam mitigados.

Esta noção não tem nada de revolucionária, ou socialista.

Ela está estampada como princípio constitucional: a cada um o tributo na forma de sua capacidade (contributiva).

Salvo a candidata do Psol, nenhum dos candidatos apontou na direção óbvia: 

Ora, se faltam recursos, primeiro socorramos os mais pobres!

Se alocar recurso para gerar dinâmica econômica criasse alguma forma de melhorar a vida dos mais pobres, nossa cidade, o Estado, enfim, o País seriam um paraíso terrestre.

Digo mais: O próprio capitalismo mundial seria perfeito, já que desde toda e qualquer crise, desde o século XVII (A Crise das Tulipas) até a de 2008, foi o dinheiro público (dos impostos e de TODOS os contribuintes) que salvou a dinâmica capitalista, seja pela injeção de recursos, propriamente dita, seja nos gastos sociais advindos da necessidade proteção social aos milhões de excluídos durante as quebras capitalistas.

Fora de tempos das chamadas "crises", temos toda a sorte de subsídios, incentivos fiscais, e até os "incentivos" ilegais, que se concretizam na omissão dos entes federativos em cobrar com rigor os impostos sonegados.

Estes recursos somam trilhões de reais que não significaram um centavo de auxílio social ou a mais leve melhoria de vida dos mais pobres, ao contrário.

Em períodos de arrocho orçamentário, são justamente os serviços públicos mais básicos prestados aos mais pobres que faltam primeiro, assim como os vencimentos dos servidores.

Ao mesmo tempo que na falta de "apoio estatal" e de investimentos públicos (contratos de bens e serviços), empresas não hesitam em mandar seus empregados para rua, aumentando ainda mais a demanda por socorro social, com sobrecarga extra a tais orçamentos já antes exauridos com renúncias fiscais e isenções tributárias.

Recebem trilhões sob a justificativa (falsa) de geração de empregos, mas quando a economia quebra, a primeira medida é mandar embora os empregados, enquanto protegem seus lucros, concentrando ainda mais renda, e jogando os desempregados à própria sorte (ou azar).

Todo este cenário é cíclico: falta ao Estado dinheiro porque deu aos mais ricos, que concentram riqueza e geram mais desigualdade, desigualdade que aumenta a demanda por atendimento público, que é precário porque o dinheiro já foi desviado aos mais ricos com a justificativa de que gerariam riqueza, mas só geraram...mais desigualdade.

Apesar de todos os esforços dos intelectuais, e de vários envolvidos, uns de forma mais honesta, outros mais cínicos, o horizonte que se avizinha para a cidade de Campos dos Goytacazes não é muito diferente daquele que a trouxe até aqui.


Sugiro ao novo prefeito que coloque na entrada dos limites da cidade a famosa frase de Dante Alighieri na sua obra Divina Comédia:

"Lasciate ogni speranza, voi che entrate"

(Perdei toda esperança, vós que entrastes)





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